sábado, 27 de junho de 2009

“Il est brisé, n'y touchez pas”

" (...) No fundo, desconfio que os Senadores têm uma imensa saudade de quando eram vereadores.

Voltando ao dia de ontem. Após ouvir o interminável aparte do senador Mesquita (PMDB – AC), fiquei intrigada com alguns detalhes: a) ele não se peja em manter em pé, ao seu dispor, um homem da idade do senador Simon, à espera que diga todas as coisas vagas que pretende dizer, as palavras ocas, para culminar numa sentença absolutamente inédita: “Renúncia é ato voluntário”! ; b) se era para ser visto nas TVs do Acre, para que desse tempo de aparecer em um vídeo que depois entraria em horário nobre na TV local, para que seus eleitores olhassem um instante e dissessem “Ih! olha lá o Mesquita!”, mais valia fazer uma boa pose, tipo “O Pensador”, ficava melhor; c) depois de torrar a paciência até do franciscano Simon, que deu a entender que o aparte já estava longo, o acreano saiu-se com esta: “Tenha paciência comigo, senador Simon, olha que eu podia estar assistindo ao jogo do Brasil!”.

São uns fenômenos. Sinceramente, eles não são deste mundo. Estão em outra.

(...)

Há um poema de Sully Prudhomme chamado “O Vaso Partido”. O poeta era romântico, do fim do século 19. Falava de amor e de amantes com o coração ferido. Desculpem a tradução livre e em prosa, não sou poeta, nem gosto de poesia traduzida. Prefiro contar o que o poeta quis dizer:

“O vaso onde morre essa verbena foi rachado pelo golpe de um leque; foi uma batida leve, nem ruído fez. Mas a rachadura, muito fina, foi roendo o cristal pouco a pouco, numa caminhada invisível e firme e se ampliou lentamente. A água fresca fugiu gota a gota, o sumo das flores esgotou-se; ninguém ainda se deu conta, não toquem, ele está quebrado. Muitas vezes a mão que amamos, esbarrando em nosso coração, o magoa; depois o coração vai se partindo sozinho e a flor de seu amor morre; ainda intacto aos olhos do mundo, ele sente aumentar, e chora baixinho, o ferimento fino e profundo: está quebrado, não toquem”.

Desde ontem ecoa em meus ouvidos o último verso “Il est brisé, n'y touchez pas” (está partido, não toquem) a cada vez que ouço falar ou leio sobre a situação em que se encontra o Senado Federal. Não, não é o Senado, nem mesmo o Congresso, ou o Governo como um todo, que eu temo estar partido. É a democracia, flor tão tenra e delicada quanto a verbena do poeta.

Não vejo ninguém do Governo tomar cuidado, nem parecem se dar conta da rachadura fina que cresce, cresce, cresce. Mas a seiva vital está fugindo, gota a gota..."


Este trecho é do texto O vaso partido escrito por Maria Helena Rubinato, foi retirado do Blog do Noblat.

Adorei o final reticente... afinal não cabe um ponto final nessa história.

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